Jovens também correm risco de sofrer derrame cerebral
Diagnóstico errôneo de vertigem, enxaqueca, embriaguez, convulsão, labirintite ou outros problemas, faz com que jovens recebam alta sem o tratamento adequado e sofram complicações
Seis anos atrás, Todd McGee era um trabalhador do setor da construção civil, magro e atlético de 34 anos que morava com a esposa e a filha pequena em Martha's Vineyard, onde passava os fins de semana de verão surfando. Um derrame cerebral mudou sua vida para sempre.
Hoje, com um braço inutilizado e dificuldade para falar, McGee, agora com 40 anos, não pode trabalhar. Ele dedica a maior parte do tempo a se manter o mais saudável possível. Embora consiga dirigir e cuidar da filha, agora com sete anos, tudo demora mais, ele tem problemas para se concentrar até mesmo em atividades rotineiras que outros desempenham com facilidade, como fazer compras no supermercado.
— Sem sombra de dúvida, eu gostaria de ter a minha vida de volta, construir casas, barcos e surfar no tempo livre — diz.
Sua experiência, complicada por um atraso sério de diagnóstico, é um lembrete poderoso de que derrames podem e acontecer com gente jovem. O quanto antes o diagnóstico for feito, menor é a probabilidade de o resultado ser uma deficiência para o resto da vida.
Embora a grande maioria de derrames ocorra nas pessoas com mais de 65 anos (o risco é 30 a 50 por mil nesta faixa etária), de 10 a 15% dos casos afetam pessoas de até 45 anos (risco de um em mil). Um estudo realizado por médicos do Programa de Derrames do Centro Médico de Detroit, da Universidade Estadual Wayne, descobriu que entre 57 vítimas jovens de acidente vascular cerebral (AVC), uma em sete recebeu o diagnóstico errôneo de vertigem, enxaqueca, embriaguez, convulsão, labirintite ou outros problemas, recebendo alta sem o tratamento adequado.
— Embora as vítimas jovens de derrame se beneficiem mais do tratamento imediato, ele deve ser administrado dentro de quatro horas e meia — diz o neurologista Seemant Chaturvedi, da Wayne, que dirige o programa e efetuou o estudo.
Depois de 48 a 72 horas, não existem grandes intervenções disponíveis para melhorar o resultado do derrame, segundo o médico.
— Sintomas repentinos, mesmo parecendo triviais, justificam uma investigação meticulosa — acrescenta.
Análises posteriores do estudo de Detroit mostraram que os pacientes atendidos por um neurologista no pronto-socorro, bem como quem passou pelo exame de ressonância magnética como parte da investigação diagnóstica inicial, tinham uma probabilidade menor de receber um diagnóstico errado.
— Além disso, os pacientes deveriam estar cientes do risco de derrame independentemente da idade — afirma Chaturvedi.
Os Centros para Controle e Prevenção de Doenças relataram um aumento abrupto dos casos de AVC entre pessoas na casa dos 30 e 40 anos. O aumento nos fatores de risco — obesidade, diabete, pressão alta e apneia do sono — e o aperfeiçoamento do diagnóstico explicam o crescimento.
Porém, os pacientes jovens não estão em melhor situação hoje em dia para o reconhecimento dos sintomas do derrame.
— Somente de 20 a 30% dos pacientes chegam ao pronto-socorro em até três horas do início dos sintomas. Eles costumam esperar para ver se os sintomas desaparecem por si só, aparecendo no PS de 12 a 24 horas depois — explica.
Depois de uma atividade intensa surfando no dia anterior, McGee acordou pela manhã com cor de cabeça e mal-humorado. Ele foi trabalhar, mas voltou para casa com náusea e arrepios. McGee supôs estar pegando a gripe enfrentada pelo resto da família.
Depois, no meio da noite, a dor de cabeça descrita por ele como "a pior dor da minha vida", o levou ao pronto-socorro. O médico que o atendeu imaginou ser uma dor de cabeça por tensão muscular, o tratou com analgésicos por via intravenosa, receitou remédios e o mandou para casa.
Envergonhado por ter ido ao hospital "somente por uma dor de cabeça", McGee tomou o remédio quando a dor voltou na tarde seguinte. Logo depois, surgiram o que ele pensou serem efeitos colaterais da medicação. Agora ele sabe o que realmente aconteceu: um ataque de isquemia transitória, uma espécie de miniderrame, que o deixou durante algum tempo incapaz de falar e com metade do corpo dormente.
Naquela noite, ele caiu da cama tentando ir ao banheiro e perdeu o controle da bexiga no caminho. McGee percebeu que um braço começou tremer de forma incontrolável. Ele voltou ao PS, onde dois médicos pediram uma tomografia computadorizada, que sugeriu uma enxaqueca severa ou AVC. À época, o hospital não possuía equipamento para ressonância magnética, o qual poderia ter revelado o verdadeiro problema: um derrame provocado por uma ruptura na artéria carótida, responsável por alimentar o cérebro.
Até a ambulância e a balsa levarem McGee a Boston, onde foi confirmado o diagnóstico de derrame, era tarde demais para o medicamento que destrói coágulos tPA atenuar os efeitos do derrame; a droga deve ser injetada por via intravenosa dentro de três a quatro horas. (Embora alguns médicos temam que o tPA possa causar uma hemorragia fatal numa pessoa com a carótida rompida, Chaturvedi disse que a medicação é "segura e eficaz" em tais pacientes.)
Quedas repetidas ao surfar, possivelmente combinadas a uma fraqueza arterial inerente, são a possível explicação para o AVC de McGee. Outras atividades que podem causar a ruptura da carótida são as que envolvem contrações repentinas no pescoço, como mergulho, golfe e tênis, além de manipulação quiroprática e dobrar a cabeça bastante para trás (o chamado derrame do salão de beleza).
Porém, a maioria dos derrames que afetam os adultos jovens resulta de coágulos precipitados pelos fatores de risco cardíacos usuais: obesidade, pressão alta, colesterol alto e tabagismo. Abuso de álcool e drogas também são fatores contribuintes; entre as mulheres, o uso de pílulas anticoncepcionais pode elevar o risco de derrame. Pessoas propensas a enxaquecas também têm um risco pouco maior de derrame.
Ao contrário do ataque cardíaco, a maioria dos derrames é indolor. Mesmo que os sintomas iniciais sumam, eles devem ser levados a sério.
— A tomografia não mostra derrames muito bem nas primeiras 24 horas — disse Chaturvedi.
No caso de diagnóstico incerto, deve ser efetuada uma ressonância e o neurologista precisa ser consultado no pronto-socorro.
— Os pacientes devem ser proativos, insistir em exames completos e pedir para serem atendidos por um neurologista. Os médicos do PS devem considerar a possibilidade de derrame independentemente da idade do paciente — conclui.
A principal característica dos sintomas do AVC é seu aparecimento repentino. Assim, assegura Chaturvedi, não importa a idade da pessoa, o aparecimento repentino de qualquer um dos seguintes sintomas deve motivar uma passada no hospital o mais rapidamente possível:
— Dormência ou fraqueza da face, braço ou perna, principalmente num dos lados do corpo.
— Confusão, problemas para falar ou compreender a fala.
— Problemas para ver com um ou os dois olhos.
— Dificuldade para caminhar, tontura ou perda de equilíbrio ou coordenação.
— Dor de cabeça severa e repentina sem causa conhecida.
Fonte: Zero Hora