Cirrose hepática não alcoólica tem relação direta com o estilo de vida
A enfermidade pode surgir em pessoas obesas, diabéticas, nos que têm resistência à insulina e naqueles que adotam alimentação pouco saudável
Um estudo recente desenvolvido no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC/UFMG) mostra que a doença hepática gordurosa não alcoólica, conhecida popularmente como cirrose hepática — que ataca o fígado, comprometendo suas funções — tem relação direta com o estilo de vida dos pacientes. A enfermidade pode surgir em pessoas obesas, diabéticas, nos que têm resistência à insulina e naqueles que adotam alimentação pouco saudável. Foi o que concluiu uma pesquisadora do Ambulatório de Fígado do HC/UFMG, a nutricionista Silvia Ferolla.
Durante dois anos e meio, ela avaliou 96 pacientes, com idade entre 20 e 70 anos e diagnóstico recente da doença. O objetivo era descobrir o padrão dietético deles.
— O diagnóstico da doença foi feito por médicos especialistas, que encontraram, no exame de ultrassonografia, imagem sugestiva de acúmulo de gordura no fígado. Além disso, foram descartadas hepatite por vírus, doença autoimune, hepatite medicamentosa, hepatite alcoólica ou outras doenças do fígado. Dessa forma, o diagnóstico da doença hepática gordurosa não alcoólica foi feito por exclusão — explica a nutricionista, que coordena o Serviço de Nutrição Clínica do Hospital Vera Cruz e é professora do Centro Universitário UNA.
Ela apresentou dissertação de mestrado no Departamento de Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da UFMG.
Todos os pacientes acompanhados, segundo Silvia, mantinham um padrão de dieta diferente do preconizado pelo Ministério da Saúde no Guia Alimentar para a População Brasileira. Apresentavam consumo excessivo de alimentos do grupo das carnes (frango, carne de boi, carne de porco, peixe etc), das gorduras (óleo vegetal, manteiga, margarina) e dos açúcares (açúcar, doces em geral) e costumavam registrar ingestão deficiente de alimentos dos grupos do leite e derivados e das frutas.
Na avaliação da ingestão de nutrientes, observou-se reduzido consumo de cálcio, fibras e vitaminas oxidantes, como a A e a C.
— O carboidrato é apontado nos principais estudos sobre o assunto como um dos vilões da esteato-hepatite não alcoólica. Quando analisamos o carboidrato consumido pelos pacientes, observamos adequação em termos de quantidade. Entretanto, o tipo de carboidrato ingerido foi inadequado: houve consumo excessivo de açúcar simples. Grosso modo, a ingestão de uma goiabada, por exemplo, é muito mais prejudicial do que a de um pãozinho francês todos os dias — explica.
Saiba mais sobre a doença
A cirrose
O acúmulo de gordura (cirrose), sobretudo na forma de triglicerídeos, dentro das células do fígado, pode causar prejuízo às suas funções. Até a década de 1980, acreditava-se que o acúmulo de gordura e a inflamação do fígado (hepatite) eram causados pela ingestão de álcool. O conceito foi derrubado pelo médico alemão Ludwig J. e colaboradores, que observaram, à época, as mesmas alterações em pacientes que não consumiam bebidas alcoólicas. Assim, eles denominaram de esteato-hepatite não alcoólica a forma potencialmente grave da doença hepática gordurosa não alcoólica. A partir daí, várias pesquisas surgiram para entender a enfermidade.
Os fatores de risco
:: Entre os vários fatores de risco da doença citados pela nutricionista Silvia Ferolla estão a obesidade, a resistência à insulina, o diabetes, os altos níveis de colesterol e os triglicérides, além da hipertensão.
:: A maior parte dos pacientes com fígado gorduroso apresenta um conjunto dessas doenças associadas, quadro chamado de síndrome metabólica.
Quem é afetado
:: A doença é observada em todos os grupos etários. Dados da Sociedade Brasileira de Hepatologia, que buscou traçar o perfil clínico epidemiológico da doença no país, demonstraram que ela é mais comum em pessoas com idade média de 50 anos.
:: Mas já se sabe que esteato-hepatite não alcoólica também acomete crianças, segundo a nutricionista, em função do aumento da obesidade infantil nos últimos anos.
:: Entre 70% e 80% dos obesos e dos diabéticos apresentam a doença, bem como 5% da população magra.
O desafio
:: O objetivo dos estudiosos é encontrar o tratamento medicamentoso para a doença. Há várias drogas em estudo, sobretudo aquelas que tentam atuar na redução da resistência à insulina. Mas, até o momento, não tiveram nenhum resultado na melhora da fibrose no tecido hepático, que ocasiona a cirrose.
A importância
:: O fígado é um órgão vital com importantes funções no metabolismo de espécies químicas que circulam no organismo. É responsável pela destruição das hemácias e pela emulsificação de gorduras no processo digestivo, por meio da secreção da bile. Armazena e libera glicose, sintetiza as proteínas do plasma e do colesterol e produz triglicérides (gorduras), além de converter amônia em ureia, entre outras funções.